terça-feira, 3 de março de 2009

Três notas


Três Notas
Três notas em teu coração escutei.
Três sussurros que se dissiparam;
Três como os ventos que se abraçaram,
Como as tríades que recitei,
Como a dor, como o pranto, um afar
Que dançantes amparam impretas;
Os sussurros errantes das gretas
Os saldosos vagidos do mar.

Mulher! teu pranto é belo é direto
Teu pranto é calado é complicado
Não se exalta nem é revoltado.

Teu pranto é de tamanho indiscreto
Um murmurio em dolente caminho
Incrustado por cascos de vinho...


(Gabriel de Alencar)

A perda

A perda



Já perdi a linha dos pensamentos

Que em minha cabeça se formavam

Perdi meus olhos diante desse espelho

De sombras. Sem reflexo perdi céu e mar,

Num pergaminho talvez ou então

Diante de um silêncio que soa em cada pagina vazia

De um livro que não possui uma sequer letra


E quando me mudo a cada novo sol mudo

E me prostro a cada lamento lunar

Onde vendaval de nuvens escuras

Não ousam turbar a face da lua.


Esgueiro-me entre as pedras em mim atiradas

Por aqueles que um dia meu coração

Que mesmo quando em dor estendi,

Para que sufocassem suas magoas...



Gabriel de Alencar

A composição de uma quimera

A composição de uma quimera



A uma sombra que coroe a alma

Que dilacera o espírito,

Crava estacas no peito,

Se desfaça de cordeiro, se finge de morto.

Implora para viver, e consome até o osso.


Perambula sem rumo, sem motivo.

Permeia os mistérios do coração,

Confunde o espírito, freme o corpo.

Faz-te tropeçar, te faz cair e de ti sorri.

Engana-te, prejudica-te, e se esconde em ti.


Sonda teus mistérios, brinca contigo.

Corroí a vontade, desgasta a alegria.

Vive em função da destruição,

Como um parasita a sugar a tua vida...


A um lobo que a tudo destrói

Que tudo consome, que tudo mata,

Que arranca do peito a estaca do primeiro

Para que morra mais rápido.


Que se move no frio na noite

Que sussurra os múltiplos sussurros do U.

Vaga na escuridão, esconde-se da luz.

E chora por ter de ser assim...


A um poeta que teme amar,

Que a sua existência lhe causa dor,

De um sonho que não pode sonhar.

Onde o tudo não passa de pouco

E o acaso uma irrealidade pérfida.


Uns três versos onde se perde a rima

Onde se perde no tempo, no pensamento.

Que no nada se esconde, como um soneto;

Esperando que alguém possa lê-lo

Esperando que alguém possa entendê-lo...


Esperando por o pensamento certo

Pela pessoa certa, pelo véu certo...

Comparar com o nada e com ninguém

Aquilo que tem como tudo.


Ser a questão do que não sou,

E querer ser aquilo que não posso.

Matar a vida ou viver a morte;

Como uma quimera de três corações

O primeiro de uma sombra,

O segundo de um lobo,

O terceiro de um poeta...


(Gabriel de Alencar)

Algo a aprender...

Algo a aprender...

Chorai e secai de teus olhos as lágrimas,
Para que estas não sejam em vão.
Gritai o uivo dos lobos do norte,
Para que não esqueça de ti a voz da lua.
Suplicai essa suplica amarga,
Para que não se perca tua amargura.
Ameis até que sangre o seio cálido,
Para que não esqueçais;
De chorar, de gritar e de suplicar
A beira dos promontórios do oeste.
Nem que seja, pela Dor.
Aprendei a amar...

(Gabriel de Alencar)

Até que a mosca morra

Até que a mosca morra


Um sentido lógico eu devo pensar

Não o sei como mais devo fazer

Onde... Talvez não... Por quê?

O que trarei eu sozinho, aliás,

Não o sei por isso devo pensar...


Penso na teia no canto da sala;

Na mosca presa nela. Olho a sua angustia.

Pode ser como eu preso à minha mente.

Preso ao meu corpo, a minha dúvida.

Um não ter escolha de estar nela,

Ou de ir dela... Quem o sabe?


Preso a uma teia, ou talvez a mentira.

Quem sabe senão um sonho,

Ou realidade esquizofrênica.

Depende de mim ou da mosca?

Pensar em realidade, ou acreditar ser um sonho,

Tendo como a raiva da humanidade o escudo...


Esqueça-me no vinho.

Deixe-me afogar no meu monstro.

Até que a mosca morra no canto da sala,

Devo pensar, devo refletir.

Procurar talvez um meio de fugir dela,

Ou talvez prender-me a ela inda mais...

Como fui parar no canto da sala;

Isso é algo que eu não faço idéia...


(Gabriel de Alencar)

O que se pode vê alem dos olhos

O que se pode vê alem dos olhos...


Um recôndito obscuro carrega no ser,

Nas entranhas das expressões, dos sonhos.

Perdido entre a mente, o corpo e o riso,

Ele lamenta sem a intenção...


Ele se angustia sem saber,

Chora sem querer, grita sem ser ouvido,

Pede por favor, mas não é atendido,

E se cala sem explicação...


O que ele é não se sabe,

Não se pode vê-lo, mas o percebo;

Quando no profundo dos olhos o encontro.


Sua existência causa medo,

Sua fala devaneios,

Sua falta à loucura...

Gabriel de Alencar